Aula nao e necessariamente aprendizagem

Pedro Demo

Resumo


Chamar a aula de trambique de professor e logo ofensa irreparavel para grande parte dos professores, porque so fazem isso na vida. Definem-se como profissionais que "dao aula" e para tanto sao contratados, sobretudo quando sao "horistas". Professores basicos nao sao, como regra, horista, mas, em muitos casos "dao aula" pela manha, tarde e noite, quase sempre para ganhar uma miseria. Exaurem-se, dando aula. Evidentemente, esta expressao tem apenas finalidade retorica e didatica quer provocar a discussao aberta. Peco, pois, que o professor nao perca tempo em se ofender, apenas se disponha a discutir comigo, brandindo, nao dardos envenenados, mas argumentos. Aqui temos o caso lidimo da relevância plena da "autoridade do argumento", nao do "argumento da autoridade". Em grande medida, aula e tipico argumento de autoridade, pois se mantem por conta da autoridade do professor, nao por sua necessidade didatica. A diferenca entre autoridade do argumento e argumento de autoridade e monumental. No segundo, agimos de modo instrumentista, de fora para dentro, de cima para baixo, esperando que o aluno se submeta, se alinhe na condicao de objeto, geralmente atraves das reacoes classicas de escutar com toda atencao, tomar nota de tudo e devolver ipsis litteris na prova. No primeiro, aparece o gesto autopoietico de dentro para fora, tipicamente reconstrutivo politico, na condicao de sujeito participativo, constituindo neste processo dinâmico, complexo nao linear, sua autonomia historica. Relação pedagogica e de autonomia, como sempre quiseram todos os grandes educadores, desde pelo menos Socrates. Etimologicamente, educar provem de "educere" (latim) e quer dizer "retirar de dentro". Paulo Freire, ao colocar sua intuicao soberba da "politicidade" da educação, sugeria:: "o bom educador e aquele que influencia seu aluno de tal modo que o aluno nao se deixe influenciar" (DEMO, 2002b). O professor, obviamente, age de fora, porque e fator externo, mas o processo educativo se instala de dentro, quando os dois lados se comportam como sujeitos envolvidos em dinâmicas reciprocas, nas quais a influencia precisa tornar-se libertadora, nao cerceadora. Neste texto, busco polemizar sobre a aula, nao para acabar com ela - vai continuar como trofeu do professor, mas para coloca-la em seu devido lugar. Tem seu lugar, mas e caracteristicamente supletivo. Nao pode, em hipotese alguma, ser o centro da didatica. Neste centro esta a aprendizagem do aluno, nunca a aula do professor. Parto da nocao de que cabe ao professor cuidar da aprendizagem do aluno como compromisso fatal. E retiro dai a conclusao que pretendo agora argumentar da melhor maneira possivel: quem de verdade quer cuidar da aprendizagem do aluno, nao da aula, mas faz o possivel e o impossivel para que ele possa aprender bem; ai cabe a aula, mas como gesto de acrescimo, nao como essencia de uma relação autoritaria e instrucionista. Uma das excrescencias mais gritantes do professor e considerar a aula como expressao maxima da "relação pedagogica", que, a estas alturas, esquece do aluno, pois o deixa como figura decorativa num processo onde deveria ocupar nada mais que o centro.

Palavras-chave


Palavras-chave : Focalização de Politicas Sociais; Sociedades de Classes e Focalização; Politicas Sociais Universais; Focalizadas e Multiculturalismo; Distribuicao de Renda e Poder

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